Faleceu nesta segunda, 24, o jornalista Sérgio de Souza de 73 anos. Sérgio exerceu o jornalismo por mais de 50 anos, passando por grandes empresas. O ponto alto de sua carreira foi ser um dos pais da Revista Realidade, marco no jornalismo brasileiro. Em 1997 fundou a ‘Caros Amigos’, revista que existe até hoje.
Sérgio, era um dos meus ídolos no jornalismo. Tive a oportunidade de conhecer este grande mestre, no fim de janeiro passado. Conto aqui a história com os detalhes que lembro. Desde que conheci e me apaixonei pela Revista Realidade, sempre quis conhecê-lo. Afinal, ele era o homem do texto, o homem que criou o padrão de texto que fez da publicação um marco histórico no jornalismo brasileiro.
No início do ano, me vi com 23 anos, jornalista recém formado – primeiro mês como formado -, desempregado e sem muita esperança de entrar nesta área que amo e sonho em integrar desde os meus 11 anos de idade.
O que fiz? Mandei meu currículo com pedidos de emprego para professores, jornalistas que eu tinha contato e outros conhecidos. Sérgio foi um deles e um dos poucos que responderam ao meu e-mail. A resposta foi a seguinte:
“Alô, Caio. Obrigado pelos elogios, é sempre bom, principalmente quando vem de cabeça jovem. Mande seu TCC, eu gostaria de ver. E o currículo também. Quanto à oportunidade, o problema nosso -- você deve imaginar -- é a falta de dinheiro, para falar claro. O que não impede que você venha bater um papo, estou à disposição.
Abraço
Sérgio”
Este e-mail soou como um baque. Como pode, um dos meus maiores ídolos no jornalismo, responder a um e-mail de um desconhecido, convidando para um bate-papo? Evidente que respondi, marcando uma conversa para a mesma semana. Dois dias depois. Confesso que não dormi direito, como um adolescente babão ou uma criança ao aguardar um presente.
Chegou-se o dia. Quarta-feira, ao meio dia, ônibus lotado e metrô, uma hora depois, estava eu na Rua Fidalga, na redação da ‘Caros Amigos’. Ao chegar fui recebido pelo Thiago, o secretário de redação, braço direito de Sérgio. Ao fundo, a mesa de Sérgio, em que ele analisava um texto e com um marca-texto sublinhava partes e fazia anotações ao lado. Thiago me levou até a mesa de Sérgio, que se levantou e me cumprimentou com ênfase. Tremi, poucas palavras pronunciei. Estava diante da história, do exemplo, do cara que ajudou a revolucionar o jornalismo brasileiro.
Sentamos e conversamos como dois camaradas. Levei um exemplar de meu TCC para ele, que atenciosamente folheou-o e prometeu ler quando estivesse com mais tempo. Comentamos algo sobre as matérias, sobre as dificuldades de fazê-las e eu lembrei-me imediatamente de uma matéria maravilhosa dele. A reportagem ‘Eu senti o preconceito nos EUA’, escrita por Sérgio na Realidade em 1968, onde ele passou dias com uma família negra no sul dos EUA, no auge do apartheid americano. Ele lembrou e comentou do prazer de fazer essa matéria. Falamos também sobre diversos assuntos: Caros Amigos, Realidade, Paulo Patarra e sua saúde,Eleições Americanas, Grande mídia e as dificuldades de um jornalista recém formado.Logo após, Sérgio me apresentou a outra figura mitológica que estava do nosso lado. Mylton Severiano da Silva, o Myltainho.
Depois de um papo com Myltainho, fui me despedir de Sérgio. Já passava das 13 horas, e tanto eu quanto ele – creio – tínhamos outros compromissos. Despedimos-nos com um abraço cordial, o meu muito obrigado e a promessa de manter contato. E mantivemos. Trocamos e-mails após o falecimento de Paulo Patarra e depois também. No último e-mail, quando perguntado se já tinha lido meu TCC ele respondeu:
“Alô, Caio. Estamos em meio a um caminhão de trabalhos, não tive tempo ainda de ler suas matérias do TCC. Farei assim que folgar.
Abraço
Sérgio”
Não sei até hoje e não sei se saberei se Sérgio de Souza leu a minha revista. Mas só pelo ato de responder ao meu e-mail, de aceitar um bate-papo comigo, um desconhecido mostra a grandeza deste cara. Caráter ímpar. Gentil, educado e atencioso. Acima de tudo, um tremendo jornalista. Fará falta. Assim como faz falta: Paulo Patarra, Narciso Kalili, Hamilton Almeida Filho e tantos outros. A Revista Realidade está aos poucos saindo da vida e entrando cada vez mais na história.
Meus caros, a reposição de peças no jornalismo não está sendo feita de forma equilibrada. Vão-se os Paulos Patarras, os Sérgios de Souzas e ficam aberrações reacionárias e desequilibradas, pseudo – jornalistas. Pobre jornalismo.
É triste essa situação, o aperto no coração é grande. Mas fica pra sempre o exemplo, os textos e o profissionalismo de Sérgio de Souza.
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